Yago Oliveira e sua “Lírica Geométrica”


  Se tem algo que me encanta é descobrir — ou redescobrir — talentos da moda aqui em Natal. E o nome da vez é um velho conhecido que vem trilhando sua jornada de forma singular e poética: Yago Oliveira.

 Em setembro, durante o evento ArteModa Potiguar, uma iniciativa que celebra e revela novos criadores do RN, Yago brilhou. Entre tantos inscritos no concurso, ele foi um dos seis selecionados. E olha... sem querer puxar sardinha por já conhecer o trabalho dele, mas foi o desfile que mais me tocou — pela estética, pela pesquisa e, principalmente, pela autenticidade.

Moda que nasce das memórias: arquitetura, sertão e modernidade

  Yago é formado em estilismo pelo SENAI e sua coleção “Lírica Geométrica” parte de uma inspiração potente: as casas populares do sertão potiguar, que ao longo dos anos migraram para a capital e ainda sobrevivem em algumas ruas da cidade. Essas construções, apesar de simples, carregam uma beleza rara. São casas de muros de taipa, paredes caiadas com tons vivos, portas e janelas de madeira e, claro, as platibandas, que escondem o telhado e conferem certa elegância modernista à arquitetura local.

  O mais curioso é como esse tipo de construção foi impactado pelo Art Déco, que chegou ao sertão na década de 1920 — pasmem! — através dos Correios. E é essa mistura entre o popular e o moderno, entre a festa de reis e a noiva puritana, que Yago traduziu de maneira liricamente geométrica.

Yago Oliveira e sua “Lírica Geométrica” Artmoda potiguar


    Na passarela, a coleção trouxe formas que remetem diretamente a essas construções: quadrados, círculos, triângulos, losangos — tudo desconstruído e reorganizado em peças que ora são estruturadas, ora leves e fluidas.

 As modelagens falam da rigidez dos muros, mas também da suavidade do tempo que passa nas calçadas. São roupas que se vestem de afetividade e resistência, traduzindo uma narrativa de identidade, fugindo de estereótipos do “sertão estilizado” e entregando uma moda que pensa e provoca, sem perder a beleza estética.

O sertão é vanguarda

 O que mais me encantou em “Lírica Geométrica” foi justamente a subversão dos clichês visuais sobre o sertão. Nada de chapéu de couro e renda óbvia. Yago mergulha fundo na história visual de uma região que, mesmo empobrecida historicamente, conseguiu desenvolver formas arquitetônicas sofisticadas — ainda que com recursos limitados. E é nesse gesto de observar o detalhe, de extrair poesia da pedra bruta, que ele mostra a potência da sua visão de mundo e de moda.

Nas palavras do próprio release da coleção:
"Há muitos níveis insondados, muitos estágios misteriosos nas relações entre as massas e o que se convencionou a chamar de modernidade."
  É sobre isso. Sobre ressignificar a ideia de modernidade a partir da experiência local. Sobre revelar que, sim, o sertão também é palco de vanguarda.
Yago Oliveira e sua “Lírica Geométrica” Artmoda potiguar
   
  A coleção de Yago é, mais do que um desfile, uma declaração de intenções. Uma moda que se ancora na arquitetura, mas que voa alto em significados. Ele é daqueles estilistas que não estão apenas criando roupas, mas contando histórias, resgatando símbolos e reinventando o modo de olhar para o próprio território.

  Se você ama moda autoral, com pesquisa, identidade e afeto, Yago Oliveira é um nome que precisa entrar no seu radar agora. A “Lírica Geométrica” foi só o começo.

  E que venham muitos outros capítulos dessa poesia em forma de roupa.